Arte funcional e design: psicologia da comunicação
Postado em: 04 / 11 / 2010
Nota da redação: Inauguramos com em este artigo a participação do designer e professor/coordenador de design, Felipe Garcia, como colunista do BDxpert.com. (Veja no final deste texto, mais informações sobre o nosso novo colunista). Seja bem-vindo Felipe!
Felipe Garcia
A sociedade em que vivemos sofre influências de várias partes do mundo. Os fatores sociais, econômicos e culturais se cruzam e se interligam devido à conectividade, à interatividade e à sede pelo desconhecido. Estamos ligados pelo virtual e também pelas diferentes “tribos” com as quais nos identificamos e, como consequência, a arte e o design também estão interligados, apesar de terem bases teóricas diferentes.
A arte com a sua democracia procura relacionar-se e deixar questionamentos para a sociedade, seja pelo período político que esteja passando, seja pela mensagem do artista que transmite sua identidade, sua visão de mundo ou desconstrói imagens e conceitos, em um mundo de conflitos diversos no qual paradigmas da sociabilidade são o tempo inteiro questionados e a arte se afirma como meio privilegiado de apreensão e de simultânea reinvenção da realidade.
O design, por sua vez, mantém papel determinante na sociedade por estar sempre atrelado às opiniões e às classes sociais e por se definir como um membro que pertence ou não àquele grupo, de maneira não discriminatória, por meio do vestuário, dos lugares que frequenta, pelos produtos que se consome, entre outros.
Apesar de hoje existirem vertentes de novos designers e/ou artistas que utilizam as informações das duas áreas fazendo uma mistura rica de opiniões e mensagens, dialogando psicologicamente com a sociedade, indo de encontro às informações e ao pensamento até então ditados pela mais importante escola de design, a Bauhaus.
Se voltarmos um pouco no tempo, podemos entender porque que esse pensamento bauhausiano é tão forte e, foi tão debatido no meio acadêmico e aplicado no desenvolvimento de projetos. A Bauhaus se dispersou pelo mundo, não como forma estético-formal, haja vista seu objetivo de ter, acima de tudo, um caráter pedagógico, mas como forma conceitual e ideológica. Atualmente, dissecar o que é real e o que é mito sobre a Bauhaus seria extremamente complicado.
Porém, podemos ressaltar dois aspectos que merecem especial atenção: o método de educação que ali foi desenvolvido, que era bastante adequado ao desenho industrial, e o fato de a instituição ser considerada a fonte do moderno desenho industrial. Esses dois aspectos colocam como ponto de partida, o que podemos discorrer acerca dos limites entre o artista e o designer e sua relação psicológica com a sociedade.
Na contemporaneidade, entendemos que a arte cumpre outro papel, faz pensar, questionar e agir, longe de ser um elemento puramente estético e contemplativo. O mesmo acontece com o design, que antes, com a linha de pensamento bauhausiana, era a arte aplicada à indústria, conceito instituído pela (Bauhaus), poderosa formadora da consciência profissional e intelectual dos designers na qual se dizia: “A forma segue a função.”
A partir desse ponto de convergência, podemos debater o seguinte tema: “Será que o design se apropria, em certos momentos, do conceito de arte e passa a ser além de simplesmente funcional, também contemplativo?” Podemos chamá-lo de “Arte Funcional?” Como o consumidor lida com essas indagações? Quais são suas relações psicológicas com essas áreas?
É com essas e outras perguntas que este trabalho mostra a inquietude de sabermos da ligação psicológica e da responsabilidade social que nós como artistas e designers temos com a sociedade, contribuindo para formarmos opiniões e criarmos necessidades.
Na pós-modernidade, as fronteiras entre Arte e Design vão se estreitando e se tornando uma película. Hoje quando vemos a cadeira dos irmãos Campana no MoMA –NY não sabemos se é design ou arte funcional. Sim é Design, porém, essa peça passa agora a ser institucionalizada entrando para o clã das obras de artes – sendo Design.
No que diz respeito às artes visuais, na contemporaneidade, existe uma linguagem artística classificada como arte pública. Quando escutamos falar em arte pública, pensamos em escultura, monumentos etc., mas essa arte pública de que falamos insere-se em um campo expandido como classifica Rosalind Krauss.
Hoje o espaço ganha outra dimensão, a obra gera outros significados e outros interesses inseridos em um campo aberto a inúmeras possibilidades. A arte pública é uma arte longe de estar dentro das paredes de museus e instituições controladoras. Arte pública busca um discurso social, voltado à crítica e a um sistema dominador, procurando inserir-se no cotidiano das pessoas, indo ao encontro delas, denunciando, questionando, manifestando seus pensamentos e indignações a respeito dessa cultura globalizada e massificada. Veja o exemplo das vacas da CowParade.
Outra vertente de arte pública vem dos brasileiros que se intitulam de “Os gêmeos e o BLU”. Eles trabalham uma interessante intervenção em prédios e sempre procuram evidenciar a sua “mascote”, BLU. A dupla possui trabalhos expostos no Museu de Arte Contemporânea em San Diego, Califórnia.
Os artistas que trabalham nessa vertente vêm se apropriando, se é que podemos chamar de apropriação, dos meios de expressão do design, meios estes que têm como estratégia uma comunicação visual direta para atingir um público alvo, que não é de maneira nenhuma ruim aos olhos dos designers. Seria essa mais uma forma de Arte Funcional?
“O designer projeta algo funcional antes mesmo de buscar uma representação estética, enquanto o artista busca criar o não-utilitário, antes do funcional”. Atualmente, como mostrado no início deste artigo, esta frase não se encaixa no que estamos vivenciando e, temos vários outros exemplos, além dos nossos irmãos brasileiros. São designers que possuem notória representatividade internacional como Philippe Stark, Karim Rashid, Ron Arad, Zaha Hadid, Ross Lovegrove, entre outros.
Eles mostram sua identidade de forma única e nos colocam mais uma vez a inquietude de estarem seguindo não somente os conceitos formais que nos foram até então mostrados, mas vão além, evidenciam realmente que o design pode ser sim contemplativo, racional, emocional e funcional ao mesmo tempo, estreitando ainda mais a relação que temos com as artes. Seus trabalhos desses artistas ajudam a entender melhor a relação estabelecida entre arte e design.
O conceito de que a forma acompanha a função é válido para uma época e para hoje talvez como ideal projetual, porém, observando nossa cultura material, o universo de objetos que nos cercam, percebemos que a função não é mais suficiente como unidade de medida para nossos produtos, obviamente, ela ainda é um parâmetro fundamental, mas não é indispensável.
Basta ver que diante de dois objetos com a mesma utilidade, muitas vezes optamos por aquele que mais nos agrada esteticamente, deixando a funcionalidade em segundo plano. Esse é o ponto em que queríamos chegar, ou seja, a psicologia de materiais e cores, divulgação, interlocução e a relação que o produto mantém com o consumidor seja ele Arte Funcional ou Design Contemplativo. Vejamos a seguir os exemplos:
No exemplo do artista e designer Ari Weinkle, podemos notar uma influência do abstratismo advindo de novas tecnologias como softwares de manipulação de imagens, nos quais Ari, por sua vez, adquire inspirações de moda, cultura e comportamento, ou seja, é uma mistura da técnica que se adquiriu com uma forma de pensamento e de se comunicar com a sociedade, dando bastante singularidade, personalidade e identidade ao seu trabalho.
Veja a bancos em que os últimos fatores levados em conta foram conforto, ergonomia e função, ou seja, querem comunicar alguma coisa. Arte Fucional x Design Contemplativo. Podemos notar também que a arte está inserida e se torna um importante elemento de grafismo também nas embalagens nas quais o artista e o designer trabalharam conjuntamente nesse projeto desenvolvido pela artista Cristiana Arcangeli e pela agência Interbrand, com uma única função: a de se comunicar. Enfim, podemos colocar também a arte como um elemento importante de apoio aos trabalhos desenvolvidos por designers, porém, a lição que fica é que a arte e o design possuem uma íntima relação e um grande poder, o da comunicação.Cristiana Arcangeli/Interbrand: arte se torna elemento de grafismo também nas embalagens.
Felipe Garcia é mestrando em Artes Visuais pela Universidade Estadual Paulista (UNESP) e pós-graduado em Master Industrial Design pelo Instituto Europeo di Design, bacharel em Design de Produto pela Universidade Mackenzie. De 1999 a 2001 trabalhou como designer de jóias e teve trabalhos produzidos por H. Stern e Vivara. Atuou em escritórios de design de embalagem nos quais desenvolveu trabalhos para Danone, Niasi, Adria, Bic, 3M, Pepsico, CSN, entre outros. Trabalhou durante dois anos no estúdio de design da BSH Continental Eletrodomésticos onde desenvolveu conceitos globais das marcas Bosch e Continental. Há 4 anos fundou a FF Design Studio e desde então atua nas áreas de design gráfico, de produto, embalagem, entre outras. Também é professor e coordenador adjunto do curso de Design de Produto do Instituto Europeo di Design e professor da Universidade Paulista.