Design ecológico (DE) x Design sustentável (DS)

Postado em: 14 / 05 / 2011

Márcio Dupont

Márcio Dupont

Márcio Dupont

Este artigo foi escrito para esclarecer, a partir da experiência e da perspectiva particular do autor, a diferença entre DE e DS. Outros designers com outra experiência poderão ter as suas próprias e diferentes definições.

Na atual  tsunami de consciência ecológica que inunda a nossa civilização, conceitos como:

Design for environment/design for sustainability

Enviromentally  conscious design/eco-design/green design

Design sustentável/design ecológico

Design responsável/design consciente/design verde

Surgem na mídia, nas marcas, nas embalagens, na sopa de letras, confundindo mais ainda designers e especialmente os não-designers. Pois, até no âmbito especializado do design, essa diferença ou semelhança é ambígua para os próprios designers. Mas podemos descartar todos os termos anteriores e deixar apenas dois conceitos orientadores fundamentais: design ecológico e design sustentável.

O que é Design Ecológico?

Design ecológico seria aquele que usa exclusivamente materiais de reuso, reciclagem, remanufatura de outros produtos e/ou processos. A preocupação principal do design ecológico é reduzir o impacto ambiental e o uso de materiais adotando materiais reciclados e recicláveis. Se colocarmos aqui o ciclo de vida de um produto, o design ecológico concentra-se dentro do círculo no qual se encontram recycle, reuse e remanufacture enquanto o design sustentável é o ciclo todo.

 

Ciclo de vida do site “product development for the environment” modificado pelo autor

Ciclo de vida do site “product development for the environment” modificado pelo autor

 

Podemos citar como exemplo, um designer que use madeira de desperdício (reuso, reciclagem) na elaboração de seus moveis. Esse móvel seria design ecológico a partir dessa perspectiva.

O Design ecológico pode ser classificado como tendo:

  1. Tecnologia zero ou baixa tecnologia e de produção artesanal/manual

Nesse contexto, o objetivo do design seria mais de conscientização do impacto ambiental/estilo de vida do consumidor e o seu beneficio ecológico seria inexistente ou muito insignificante, devido à pequena escala e à natureza do projeto. Aqui poderíamos colocar moveis feitos de PET ou de materiais reciclados caso em que o exercício conceitual do design é mais lúdico do que estritamente funcional.

Ações de Ongs em relação ao reuso e à reciclagem de materiais seria uma forma de design ecológico, mas não sustentável. Como exemplo podemos tomar a “poltrona de latas de spray” do designer Luigi Semeraro, construída de 200 latas grudadas prensadas entre dois painéis pintados de madeira. Produzida por ele, em edições limitadas.

 Mas quantas latas de spray e poltronas já construídas seriam necessárias para realmente diminuir o seu impacto ainda que local? E no final do seu uso, o que aconteceria com as latas de spray? Quantas latas de spray são descartadas diariamente no Brasil?

 

Poltrona ecológida construída pelo designer Luigi Semeraro (imagem do site Designboom)

Poltrona ecológida construída pelo designer Luigi Semeraro (imagem do site Designboom)

 

2. Tecnologia baixa-média e de produção semi-industrial a industrial

Aqui teríamos produtos industriais, mas ainda a partir da perspectiva do design ecológico. Aqui se incorporariam materiais “sustentáveis” externos. Por materiais sustentáveis externos se entende que são materiais reciclados ou remanufaturados de outros produtos e processos que são adquiridos pelo designer para a fabricação do seu design ecológico.

Como exemplo podemos citar o uso de madeira certificada que viria de um “ciclo sustentável externo” de outra empresa para a fabricação de móveis ecológicos. No design ecológico o designer não tem controle sobre o ciclo de vida do produto, ele apenas adquire algo sustentável (reciclado ou remanufaturado) para o seu projeto.

 

O que é Design Sustentável?

O design sustentável, por sua vez, tem uma abordagem holística desde a extração de matéria prima até descarte, em um contexto industrial de produção massiva com uso de alta tecnologia nos processos ou materiais.

 

Cadeira Zartan, de Philip Starck e Eugeni Quitlle para Magis, levada ao Salão de Milão 2011

Cadeira Zartan, de Philip Starck e Eugeni Quitlle para a Magis, levada ao Salão de Milão 2011

O objetivo do design sustentável é a redução sistemática ou eliminação dos impactos ambientais em todas as etapas do ciclo de vida de um produto, da extração até descarte. O design sustentável também permite a conexão entre duas disciplinas que antes estavam separadas, desenvolvimento de produto e engenharia “ambiental”.

Assim também colabora para aperfeiçoar o “desempenho ambiental” de determinado produto. O design sustentável permitiria então explorar e desenvolver as oportunidades “meio ambientais” para uma intervenção eco-eficiente no processo de design e desenvolvimento de um produto.

A preocupação com o meio ambiente está presente desde a etapa de requerimentos do projeto por meio de diferentes ferramentas e estratégias de analise do ciclo de vida, materiais, processos, manufatura e descarte que colaboram para que o design seja sustentável. Aqui existiria um controle maior da empresa já que ela é diretamente responsável pela administração ambiental e econômica do ciclo de vida do seu produto.

Devido a isso o design sustentável tem alto custo atrelado a uma complexa logística e implementação em, que na maioria das vezes, só as grandes corporações podem arcar com a parte financeira, logística e cultural de ser sustentável. Esses custos se relacionam ao investimento para pesquisa, otimização e uso de materiais, processos ou tecnologias novos ou já existentes mais de acordo com o meio ambiente.  

 

 Cadeira Zartan em detalhe da superfície e textura

Cadeira Zartan em detalhe da superfície e textura (imagem site Designboom)

Grandes empresas como Sony, Phillips, Apple, entre outras, desenvolveriam então design sustentável visando o menor impacto ambiental desde o inicio até o fim da cadeia de seus produtos e serviços. Como exemplo de design sustentável temos a cadeira Zartan de Philip Starck e Eugeni Quitlle, para a Magis, desenvolvida para o Salão de Milão 2011.

De acordo com eles, é uma perspectiva nova para a produção industrial em uma era pós-plástico. Feita do que eles chamam “liquid wood”, essa nova tecnologia usa pó de madeira (derivado de polpa de madeira descartada) misturado com outros materiais naturais (fibras e cera ou óleo de peixe) para criar uma alternativa (não tóxica e estruturalmente forte) aos plásticos derivados do petróleo. Sob alta pressão, o composto se comporta como plástico derretido, permitindo a sua injeção em um molde.

Espero que essa distinção entre design ecológico e design sustentável seja útil e, você designer profissional ou estudante possa abordar seu projeto de maneira mais clara entendendo melhor onde e como vai atuar.

 

Marcio Dupont  é designer de produto, analista sustentável para o design, consumo e pós-consumo.

Blog de design ecológico: http://marciodupont.blogspot.com 

Veja no blog os links de Sustainable – ecological design marcados com um asterísco.

Referência (citações e figura ciclo de vida): http://www.productdesignenvironment.info/

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Comentários (9)

 

  1. Gildo Henrique disse:

    Uau!

    Não é todo dia que temos contato com o que chamo de “conjunto da obra do design”.

    O espaço que abriga o definitivo, esclarecedor e didático texto sobre as diferenças entre DE e DS, é uma aula de layout, principalmente a “região” da cadeira Zartan.

    Bringhurst faz escola também na web.
    A semiótica me convida ao universo das palavras numa página que respira!

    Parabéns pelo uso corretíssimo do nosso idioma!

    Orgulho alheio.

  2. Parabéns pelo artigo!

    Muito bem escrito e totalmente informativo. O único ponto que gostaria de ressaltar é sobre o uso das palavras reciclar/reusar (ou reaproveitar). Em alguns pontos do artigo, notei a palavra reciclar utilizada para produtos que foram feitos de material reaproveitado.

    A diferença entre esses dois processos é que na reciclagem, a matéria em si é modificada (modificação química, principalmente). No reaproveitamento, o material não sofre nenhum tipo de transformação.

    Um exemplo claro disso é a poltrona de garrafas pet, que é um produto construído através do reaproveitamento de garrafas. Se as garrafas fossem derretidas e utilizadas para moldar uma poltrona, aí seria reciclagem.

    Tirando esse detalhe, o artigo está de parabéns mesmo!! xD

  3. Wantuelfer Fernandes Gonçalves disse:

    Excelente artigo! É bastante interessante ressaltar que, ao se falar de sustentabilidade o fator holístico é imprescindível. É isso que separa os trabalhos que realmente caminham para o sustentável dos que estão apenas tentando utilizar do termo para conquistar um nicho de mercado.
    Há de ressaltar no entanto que o liquid wood é confeccionado a partir de um desprendimento muito grande de energia, para gerar as altas pressões, energia essa provinda, possivelmente, de fontes exauríveis, o que torna a tecnologia insustentável. Porém, é um grande passo para se chegar em um material funcional e com qualidade capaz de substituir os convencionais.
    Parabéns Marcio, obrigado por compartilhar conosco seus conhecimentos!

  4. marcio d. disse:

    Adriano
    Obrigado pela correção, efetivamente não e´a mesma coisa, para o proximo artigo estarei de olho nisso! Obrigado. Um abraço.

  5. Elton Rodrigues disse:

    Excelente artigo.

    Estou desenvolvendo um trabalho de conclusão de curso no qual objetivo a construção de uma peça de mobiliário através de materiais reutilizados e, sua explanação sobre as diferencias entre o DE e DS foram de grande valia, de forma inclusive a reavaliar algumas questões abordadas em minha pesquisa.

    Sua abordagem quanto ao impacto da proltrona de spray e tantos outros nesta mesma linha, foi especialmente questionadora para mim.

    Mais uma vez obrigado.

  6. maduca disse:

    Obrigado, elton. A ideia e´sempre colaborar para uma melhor compreensão da disciplina do design e também a sua relação com o meio ambiente.

    Abraço.

  7. Emilio Augusto disse:

    Olá Márcio. Ótima iniciativa em apontar diferenças nestes conceitos. Ao ler seu texto, me veio uma observação, especificamente em relação ao design sustentável. Na sua ótica “o design sustentável tem alto custo atrelado a uma complexa logística e implementação”. A questão se refere exatamente à cerne do desenvolvimento sustentável nos âmbitos social, econômico, ecológico e cultural. Assim, se não considerarmos as questões econômicas e sociais, mesmo assim um produto com alto custo seria sustentável? Ao meu ver uma produção local de uma cooperativa de artefatos para vestuário, que tenha foco na reutilização de resíduos têxteis pode sim, ser um exemplo holístico de DS, mesmo que o foco não seja Milão.

    Grande abraço.

  8. Luís Otávio Pessoa disse:

    Estarei responsável pela disciplina Eco-design no curso de Design de Interiores na Universidade Estácio de Sá, em Niterói e gostaria de saber se algum de vocês se interessariam em dar uma palestra sobre o tema? Abraço a todos.

  9. anônimo disse:

    Quanto ignorância possui esse Sr. Márcio Dupont.
    “e o seu beneficio ecológico seria inexistente ou muito insignificante, devido à pequena escala e à natureza do projeto”.

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