Para competir estrategicamente é preciso ter personalidade única
Postado em: 25 / 08 / 2011
César Queiroz
Sejamos honestos. Está muito difícil competir. Margens diminuem, novos competidores surgem, pressões aumentam. É preciso diminuir preços? Lançar mais produtos? Ser mais ágil? Aumentar a qualidade? Algumas empresas desistem e fecham as portas. Outras continuam com muito esforço. Esforço cada vez maior.
Reduzir o timing de desenvolvimento e lançamento de produtos, ajustar preços, reduzir custos, melhorar processos. Táticas são excelentes e necessárias. No entanto, sozinhas não garantem sucesso. Basta olhar o mercado. Produtos e serviços semelhantes, empresas genéricas. Quem ganha uma pequena vantagem (timing, qualidade, preço) é rapidamente copiado. Incrementalismo não garante e nem coloca ninguém à frente.
Por isso, muitas empresas desistiram do planejamento estratégico tradicional, pois, na prática, diz Hamel: de estratégico ele não tem nada. Ao contrário, é um ritual sobre planejamentos e planos movido pelo calendário e não pela exploração do potencial do negócio. O foco é tático.
Mas então, como competir estrategicamente?
Uma personalidade relevante e única é o fator chave para o sucesso das empresas. Não há competição de igual para igual deixando escondido o que elas têm de mais precioso: sua personalidade, visão, ambição, essência, alma, DNA, identidade, “o sangue que corre em suas veias”. Essa, sem dúvida, é a base para construção da estratégia.
Toda organização é única, tem sua própria identidade. E isso se aplica a qualquer instituição na história: a igreja cristã, nações e, por que não, empresas? Existem aquelas em que a personalidade do fundador, por ser tão forte, permeia todas as áreas e equipes. Outras naturalmente são guiadas por uma ideia tão viva que invade todo o grupo. E existem muitas cuja autenticidade não é visível, que não salta aos olhos. Apesar de existir, ela está escondida.
O desafio é, portanto, descobrir e desenterrar a autenticidade da organização. Para isso, é necessário olhar para a empresa como olham os antropólogos e sociólogos para grupos de pessoas com uma causa: em busca da essência. Sejam esses grupos políticos, sociais, espirituais, esportivos.
“Empresas têm muito a ver com lealdades, com a criação de uma cultura comum, de valores compartilhados e um senso de direção bem claro”, diz Olins. Está aí o valor da personalidade, o que de fato confere unicidade para os grupos, sejam eles empresas ou não.
É a personalidade e a visão do grupo que proporcionam a cola interna, que unem e orientam a equipe. São elas que tornam cada colaborador agente da causa. Conectam com as pessoas não só dentro, mas fora, conferindo relevância e significado. Elas geram sentimentos e se tornam símbolos de autoexpressão no dia a dia das pessoas. Tornam assim a empresa única e diferente, com seu jeito singular de ser e se comportar.
Produtos e serviços comunicam seus valores e visão. Manuais e materiais de comunicação refletem a essência e sua ambição. O ambiente, onde se desenvolve sonhos e negociações, corre seu sangue, carrega e manifesta sua alma. O comportamento e o tom de voz da equipe contagiam, expressam, comunicam quem, de fato, ela é.
Conheça os 4 vetores de expressão da identidade de uma empresa
Tudo aquilo que a empresa faz (comprar, vendar, liderar) deve ser uma afirmação de quem ela é. A identidade, contudo, ganha vida, sabor, forma, cor, comportamento próprio. A razão de existir torna-se clara dando sentido ao grupo.
A personalidade é, pois, tão fundamental que Marvin Bower, o pai da consultoria de gestão e sócio desenvolvedor da McKinsey & Co. reflete sobre ela em 1953 com sua equipe: “Uma personalidade distinta e atrativa é a chave para construir a reputação de uma empresa. E – exceto pela equipe – a reputação é o bem de maior valor e retorno de uma empresa”.
A “personalidade” da empresa – como a de um indivíduo – é fator chave na impressão que as pessoas têm quando entram em contato com a empresa. Essa impressão, que Marvin chama de “impressão total”, depende de dois fatores principais. As impressões pessoais coletivas daqueles que relacionam com a empresa é um. O outro são os objetivos, políticas e abordagens da empresa que guiam (ou deveriam guiar) cada membro da equipe no que ele faz e comunica.
“Empresas com personalidades distintas e atrativas são revolucionárias”, enxerga Hamel. Têm sua forma própria de ver o mundo. Não se abalam com as convenções, não buscam aceitação, são seguras de si, entendem quem são e se comportam dessa forma. Por que ser igual a todos? Por que seguir regras e convenções se você mesmo pode criá-las? Empresas genéricas são dispersas, irrelevantes e esquecidas. Isso porque não têm, de forma clara, qual sua direção, seu propósito, causa. Não sabem de fato qual a razão de existir.
Assim como acontece com pessoas, uma personalidade tão característica, singular e própria faz nascer e crescer o bem de maior retorno de uma empresa: a marca. Ela torna-se viva, experiencial, visível. Autenticidade é, assim, o fator chave. É o substrato da estratégia e consequentemente da marca.
Competir estrategicamente é, portanto, saber quem de fato a empresa é e se portar coerentemente como tal. A construção estratégica em seu core tem as pessoas, a identidade, a relevância e o significado. Afinal, empresas não concorrem com outras empresas, elas competem por ideias, sonhos, sentimentos, emoções, significado. A tática, que é muito importante, vem depois, com planos, ações e jogadas.
Se a manga disser que é uva, será isso uma experiência agradável? Pior ainda se ela achar que é uva e disser que é abacaxi. No entanto, se ela souber que é manga, disser que é manga e se comportar como manga, quem não gostar que fique longe. Mas terá toda a fidelidade de quem ama manga.
Pare de olhar os concorrentes por um instante. Olhe para sua empresa e para seu cliente. Quem é sua empresa? Quem é seu cliente? Seja você, conecte com ele. O cliente tem o poder, a empresa não.
César Queiroz é sócio e estrategista da 2DA Branding & Design.
Bibliografia
1 HAMEL, Gary & PRAHALAD, C. K. (1996). Competing for the Future. Harvard Business Press.
2 HAMEL, Gary (2002). Leading the Revolution. Harvard Business School Press.
3 EDERSHEIM, Elizabeth Haas (2004). McKinsey’s, Marvin Bower, Vision, Leadership, and the Creation of Management Consulting. John Wiley & Sons, Inc.
4 OLINS, Wally (1989). Corporate Identity – Making Business Strategy Visible Through Design.
5 OLINS, Wally (1998). The Brand Handbook. Thames & Hudson.