Embalagens para o mundo globalizado
Postado em: 17 / 12 / 2009
Maria Edicy Moreira
No mundo globalizado em que vivemos é comum encontrar escritórios de design atravessando fronteiras com o desenho de embalagens e marcas de produtos que irão chegar ao outro lado do mundo e vice-versa. No Brasil escritórios como Rex Design, Narita Design e Müller & Camacho, têm várias experiências em trabalhar com embalagens para outros países com características culturais dispares entre si e muito diferentes para nós brasileiros.
As diferenças podem começar pelas cores aplicadas nas embalagens, na Índia e China, o branco é luto; nos países árabes não se deve usar o verde e, por aí vai. É preciso estar atento também aos termos usados no texto impresso na embalagem. Não se pode esquecer ainda que em alguns idiomas o texto é lido da direita para a esquerda, como nos países árabes e Japão, por exemplo. São detalhes que os escritórios de design que trabalham com embalagens globalizadas vão aprendendo no dia a dia. À medida que adquirem conhecimento sobre a cultura local.
No Brasil quando se fala em design de embalagens para o mercado externo na maioria dos casos os projetos vão para a América Latina. A Narita Design trabalha em projetos internacionais desde 2001 e, grande parte deles vão para países como Colômbia, México, República Dominicana e Guatemala, além disso, desenvolve alguns projetos para outros países fora da América Latina em nível mais global.
Hoje a exportação de projetos representa aproximadamente 20% do volume de trabalho desenvolvido no escritório, que tem boas histórias para contar. “É sempre muito importante conhecer in loco o ponto de venda e investigar o contexto cultural para evitar decisões baseadas na visão pessoal e no olhar “estereotipado” de quem vem de fora”, afirma Mário Narita, titular do escritório de design.
Ele conta que para o redesenho de uma linha de biscoitos, no Peru, os pequenos bazares, responsáveis por 80% das vendas do produto, são enjaulados, ou seja, os consumidores não têm contato com o produto e as decisões de compra são tomadas a distância. Essa informação foi fundamental para direcionarmos o novo visual.
“Em outro projeto cuidamos de reposicionamento visual de uma cerveja “Light” na Venezuela e, identificamos que o termo lá está ligado à capacidade de beber mais (“drinkability”), mas possui outros significados por aqui. No Brasil “Light” está associado aos produtos para emagrecimento, sem sabor, atributos indesejados em uma cerveja.”
Na Argentina a legislação não permitiu o uso de imagens de frutas nas embalagens de sucos instantâneos. “Isso nos obrigou a pensar em alternativas como o uso do líquido caindo no copo, alternativa que foi escolhida pelo cliente”, conta Narita.
A Müller & Camacho tem larga experiência no desenvolvimento das embalagens do café instantâneo, Pelé, que já teve o texto de sua embalagem traduzido para mais de 20 idiomas e hoje está presente na China, Rússia, Grécia, entre outros países asiáticos, árabes e europeus. “Ao longo dos anos fomos entendendo as diferenças da cultura de cada país”, afirma Manoel Müller, sócio do escritório de design.
Ele lembra que na Rússia, por exemplo, não adianta desenhar uma fumacinha saindo da xícara de café e escrever na embalagem: Que cheirinho bom! Porque os russos não usam esses termos para manifestar seu interesse pelo café.
Por isso, conhecer a cultura do país que irá receber o produto é fundamental e alguns cuidados básicos também como: checar possíveis restrições ou peculiaridades da cultura local. “Os países muçulmanos, por exemplo, possuem códigos de conduta para as mulheres bastante distintos dos nossos, não dá para colocar um decote ou uma regatinha”, observa Gustavo Piqueira sócio e diretor de criação do escritório Rex Design.
Para ele o mercado das embalagens globalizadas representa muito, aproximadamente 50% das embalagens desenvolvida pela Rex. “Em um mundo globalizado, a internacionalização dos produtos e do trabalho das agências de design é quase inevitável.”
Para a Rex Design, o projeto global mais importante foi o redesenho de toda a linha de sabonetes Lux (da Unilever), para o mercado global, lançada ano passado (veja box). “Foi um dos projetos mais desafiadores, pois envolvia países de culturas muito distintas, como Brasil, Arabia Saudita e China. Era necessário criar uma estrutura de marca comum a todos os países, mas respeitando os diferentes hábitos locais de cada região”, afirma Gustavo Piqueira.
Segundo ele, outro projeto interessante foi o redesign da identidade dos congelados 4Salti, para a Unilever de Portugal, pois os pratos possuíam um forte caráter local e até termos que eram completamente desconhecido por nós brasileiros.
As experiências com as diferenças de cada país não assustam os designers, que vêm nessa interação uma oportunidade para vivenciar outras culturas, conhecer novos sabores e até renovar sua forma de olhar o mundo.
Conheça os casos de sucesso desenvolvidos pela Narita Design e Rex Design
Embalagens de sucos para 60 países
O case de maior destaque da Narita foi o trabalho que desenvolveu para a Kraft Foods detentora da marca de sucos Tang. O escritório de design cuidou da concepção e implantação mundial do novo visual das embalagens de Tang.
Diferente do que muita gente imagina Tang não é uma marca brasileira. Lançado nos EUA no final da década de 50, Tang só ganhou visibilidade após ser consumido nas primeiras missões espaciais nos anos 60. O apelo popular do produto ajudou Tang a conquistar o mundo e, hoje, é umas das marcas mais globais da gigante Kraft Foods, presente em mais de 60 países.
Em 2006 a Kraft Foods identificou a necessidade de atualizar o visual das embalagens que se mantinham inalterados há anos. Para encontrar o escritório de design certo para cuidar do projeto a multinacional realizou uma concorrência entre escritórios de diversos países e a Narita Design venceu a concorrência, que envolveu um estúdio inglês e um norte-americano.
Assim junto com a equipe global de Tang, a Narita criou e coordenou a implantação do novo logo e das novas embalagens em países da América Latina, Oriente Médio, China, Índia, Indonésia e até nos próprios EUA, país de origem da marca.
“O Brasil sempre recebeu projetos de embalagem vindos de fora, mas com Tang percorremos o caminho inverso e acredito que, pela primeira vez, um estúdio de design brasileiro foi responsável pela criação e implantação de uma marca global do porte de Tang”, afirma Narita.
Sabonetes com características culinárias
Outro escritório brasileiro, a REX Design, também colocou sua criatividade em marcas globais como o projeto das embalagens para os sabonetes LUX, da
Unilever. Parceira da empresa há dez anos, a Rex Design foi contratada para reestruturar todo o portfólio de LUX, unificando o design das embalagens nos mais de cem países em que a marca atua.
Em termos de produto, a grande novidade era o lançamento da nova plataforma “Soft Skin” da marca. A nova linha Global é composta por sabonetes líquidos e em barra que possuem o chantilly como base dos ingredientes, sempre misturado com outro item “culinário”.
Para desenvolver embalagens inovadoras, dentro da categoria e integradas à identidade visual de LUX, a REX criou visuais inspirados nos universos Cosmético e Culinário. Os designers encontraram nesse mix uma maneira de criar um layout mais atrativo e inspirador.
“O principal ingrediente (chantilly) não é retratado com a aparência “culinária”’ tradicional, mas de uma maneira mais abstrata e sensorial: com consistência fluida e textura macia. Os ingredientes complementares, como o morango, aparecem fora de foco em um plano separado”, explica Gustavo Piqueira, sócio da agência, e diretor de criação do projeto.
Para integrar ainda mais o design das embalagens no Universo Cosmético, diferentes elementos do back panel foram criados: cada variante recebeu um ícone próprio – uma silhueta de mulher que retrata atitude e feminilidade, de acordo com o conceito de cada produto. Nem o código de barras ficou sem alteração: respeitando os requerimentos técnicos, o monótono retângulo foi transformado em um lúdico e carismático objeto: um delicioso banho de espuma.
